Abuso no Mapa Natal: discussão sobre destino e livre-arbítrio

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Abuso no Mapa Natal: discussão sobre destino e livre-arbítrio

Nunca, na história da humanidade, lutou-se tanto contra os comportamentos abusivos e agressões de qualquer espécie como nos dias atuais. A disputa de discursos no campo político-social tomou proporções midiáticas e, ainda que existam bolhas ideológicas, podemos nos assegurar de que os velhos paradigmas estão sendo abalados. Dentro dessa dinâmica, você que nutre interesse pela Astrologia, principalmente se participar mais ativamente desse processo de mudanças, deve sentir um grande desconforto interno ao ouvir de um astrólogo que é possível prever uma situação de abuso (sexual e/ou psicológico) previsto no mapa natal de um nativo. Parece que, ao aceitar essa ideia, toda a luta por libertação perde o sentido e, de certa forma, não há mais como responsabilizar o agressor e a estrutura histórica que sustenta este tipo de comportamento.

Como Astrólogo Tradicional e Sociólogo, eu compreendo perfeitamente este dilema porque constato, na minha experiência, que de fato é possível prever acontecimentos como este no mapa astral, mas também que isto parece, à primeira vista, extremamente anti-político. Após muito estudo e reflexão decidi apresentar algumas conclusões.

Antes de tudo é preciso limpar o terreno e afirmar categoricamente (desculpe-me por repetir isso tantas vezes em meus textos) que não há nos astros qualquer culpa ou influência sobre os acontecimentos da humanidade, nem os bons, nem os ruins. Já escrevi muito sobre isso aqui no Nodo Norte: a Astrologia não fala sobre a influência dos astros, mas trata de um estudo simbólico que parte do princípio de que há uma correspondência (reflexo, espelhamento) entre tudo o que está em cima e tudo o que está embaixo. Ao analisar a dinâmica dos céus, posso compreender os eventos da Terra e vice-versa.

Surge então uma segunda indagação: se não há uma relação de causalidade na Astrologia e o movimento dos astros segue uma lógica matemática e astronômica , estaria nossa história pré-determinada? Se o destino é tão certeiro, de que adianta lutar contra ele? Se no mapa de uma pessoa está previsto que ela será abusada, qual o sentido de lutar contra a cultura do abuso? Para responder a estes questionamentos, precisamos dar mais um passo à frente na linha de raciocínio: sim, o destino é real, caso contrário a Astrologia Tradicional não teria sobrevivido ao longo de vários milênios (aquela velha história, não pode surgir pêssegos de um pé de maçãs), mas não, o destino não é o único fator que move a história: há espaço, ainda que menor do que gostaríamos, para o livre-arbítrio. Pensemos de uma forma ampla: nosso espírito encarna num lugar e numa época, ou seja, nós estamos sujeitos a um contexto. Dentro deste contexto, construímos uma rede de relações através da cultura na qual somos inseridos e de nossos impulsos individuais: é uma negociação com o meio. Se uma pessoa nasce com um mapa que aponta para uma situação abusiva no desenvolver de sua vida, logo, se estamos em uma rede de relações, há no mapa de outra pessoa o impulso para abusar. Entretanto, nós não somos títeres de uma mão invisível do Universo: a ação pertence unicamente à pessoa, pois não há uma lei do destino que obrigue alguém a agir de maneira “a” ou “b”, o destino apenas promove, por razões que extrapolam nossa visão de mundo, o encontro da pessoa que possui o ímpeto abusivo com a possível vítima do abuso. Executar o ato ou não cabe à consciência do indivíduo, ou seja, a capacidade de enfrentar a si mesmo lutando contra o discurso que o orienta a uma ação destrutiva e com o qual ele até então corrobora. Com a tomada da consciência espiritual e social de que ele está (motivado por um impulso egoísta socialmente sustentado) prestes a cometer algo que marcará a alma de alguém pelo resto da vida ele poderá dizer não e transformar o resultado deste encontro: é aqui que mora nosso livre-arbítrio: a capacidade de dizer sim ou não para certas circunstâncias do destino. Não podemos dizer não para um acidente de carro ou para uma doença auto-imune, mas podemos dizer não para a vontade de apertar um gatilho, de roubar um bem alheio ou de ser abusivo com uma pessoa.

Por alguma razão provavelmente trazida dos “sins” e “nãos” que dissemos em uma vida passada (a Astrologia não é necessariamente reencarnacionista, então coloco aqui uma visão pessoal; a reencarnação é importante nesse meu exercício de reflexão), e pela forma como lidamos com nossos próprios desejos (também no passado), nascemos nessa vida espelhando determinada dinâmica do céu que, ao ser interpretada, revela nossas tendências de fazer o bem e o mal de uma maneira ou outra. Estes são nossos desafios internos que estão totalmente conectadas com o destino do mundo: o destino que marca encontros, que nos coloca em contato com a vulnerabilidade do outro, ou com sua força. Assim, somos responsáveis por nossos atos, mas como somos seres de pouca consciência, é provável que façamos tudo o que está escrito em nosso mapa natal. Se há no céu configurações que indiquem que, em algum momento da vida, seremos abusados ou agredidos, é porque na humanidade há abuso e agressão. A culpa não é nossa, acontece que NOSSO MAPA NATAL NÃO PERTENCE APENAS A NÓS!!! É difícil compreender isso dentro da lógica individualista moderna, especialmente com essa pseudoastrologia que faz sucesso por aí, mas o mapa astral transcende a nossa existência individual e fala sobre toda a rede na qual estamos inseridos e com a qual devemos negociar. O dia que conseguirmos extirpar o abuso da existência humana, este símbolo não será mais encontrado nos céus.

Guilherme de Carli

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